quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Ainda as uniões de facto : a esquerda e a direita

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Está novamente aberta a questão das uniões de facto.
Não vou sequer indagar da bondade, ou não, do veto de antanho ( cfr. infra nota 1 )

Interessa-me mais saber se a "questão" das uniões de facto separa ou não as águas entre a direita e a esquerda.

Se estamos em face de um assunto transversal, "não ideológico" onde estes conceitos, esquerda / direita, não relevam, como pretende o politicamente correcto. Ou não !
Propendo a considerar que a questão ainda divide estas famílias políticas .
E porquê ?

Vejamos sumariamente o historial mais recente.
A ultra direita salazarenta empenhou-se durante mais de quatro décadas em tentar incutir nas consciências as excelsas virtudes do casamento por oposição às nefandas e imorais uniões de facto. Uniões de facto contudo que sempre "tolerou" quando estavam em causa os apaniguados do regime, os mandantes e os seus serventuários .
Depois, com o 25 de Abril, a liberdade permitiu c/ a introdução do divórcio "legalizar" aquelas uniões existentes fora do casamento, que Salazar não conseguia impedir. Eram um "facto"...
Mais recentemente, e ainda em nome da liberdade, foram "legalizadas" as uniões de facto em si mesmas, independentemente do divórcio e casamento.
E sempre em nome da liberdade !
E porquê ?

Porque a LIBERDADE está no ADN da esquerda !
E porque a direita, avessa à liberdade, sempre olhou p/ as uniões de facto, não como um "bem" em si mesmo, mas como um "tumor" social.
É que a direita enfoca e aborda esta questão da perspectiva dos "egoísticos interesses patrimoniais" subjacentes, ou seja :
O que a direita pretende, e sempre pretendeu, é acautelar o património, a conjugalidade e a herança dos dinheiros e dos bens dentro das "famílias privilegiadas", sejam elas os Melos sejam os Espíritos Santos.

E quando desta perspectiva patrimonial, o casamento não era aconselhável e os afectos se sobrepunham, então a direita tolerava as uniões de facto às tais "famílias", mas só a estas.
E sempre com o mesmo objectivo: não permitir que o deserdado ficasse com o dinheiro dos seus. Pois é claro que sempre houve as grandes paixões camilianas a furar o esquema, mesmo em tempos de casamento católico indissolúvel e de regime de comunhão geral de bens supletivo ...

Bem, mas o que ao caso importa é que a comunhão dos afectos e a sua consolidação institucional, dentro ou fora do casamento, era-lhes indiferente .
O que interessava era a "família dos dinheiros"... e depois, se possível, juntar ao útil o agradável.
Ora,
Tenho para mim que a esquerda deve aqui e neste conspecto ser norteada por outra perspectiva, a da liberdade .
E daí decorrem naturalmente consequências.

O que a esquerda quer, ou deve querer, é reconhecer e encontrar outros espaços de afectos que acautelem aqueles que não pretendem casar, civil ou religiosamente.
E para tanto, basta que a união de facto seja encarada como isso mesmo, um espaço de afectos com a dignidade correspondente
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Assim,

Legislar para além disto, transformando a "união de facto" num sucedâneo do "casamento" com direitos e obrigações, designadamente patrimoniais, parece-me um contrasenso e um absurdo.
É ser mais papista que o papa...
Por que carga de água meter à força, à força da lei, os unidos de facto dentro de um espartilho, de um conceito e uma realidade jurídico-patrimonial que os próprios não querem ?!
Pois que se o pretendessem, tinham casado....

Por outro lado, é claro que
O Estado não pode alijar as suas responsabilidades na regulamentação da vida dos cidadãos, e desde logo dos agregados familiares, célula infra estrural do mesmo.
Ao Estado, enquanto tal, cumpre-lhe defender os interesses daqueles, oferecendo-lhes as ferramentas necessárias, e em particular as económicas e sociais.
Mas não, obrigando-os a assumir estatutos pesssoais e patrimoniais que não querem.
Pois que se o pretendessem, tinham casado...

Quando se fala de união de facto estamos a falar em viabilizar legalmente um outro espaço para a vivência dos afectos com a LIBERDADE que escolheram.
Não impondo baias nem constrangimentos, pois o Estado tem também que estar junto de cada cidadão individualmente, protejendo-o, viva ele em união de facto ou não.
É isso a LIBERDADE DA UNIÃO DE FACTO.

A união de facto significa dignificar o estatuto daqueles que não pretendem casar, mas cujos afectos encontram o seu espaço próprio na vida em comum. Não mais do que isso.
Esta questão divide pois efectivamente a esquerda da direita !


Há bandeiras que a esquerda não pode deixar cair !


Notas :
(1) Pelo exposto não creio que o veto presidencial se tenha ficado a dever, como diz o PR, a uma eventual transformação da "união de facto num ‘para-casamento’, num ‘proto-casamento’ ou num ‘casamento de segunda ordem"
Esta fundamentação é o eufemismo da mundivisão da direita.

(2) E é claro que quando falamos de uniões de facto, falamos para todos, heterossexuais e homossexuais, sendo que para estes há ainda que lhes reconhecer, e urgentemente, o estatuto do casamento.
E sempre em nome da LIBERDADE
E " Liberdade é sempre e exclusivamente liberdade para quem pensa diferente." ( Rosa Luxemburgo ) - citação retirada do blog "Tribuna Socialista" ( 05.NOV.09 )

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